MOVENTES
“Experimento o objeto, faço de seu movimento minha experiĂȘncia dele, nele – assim apreenderei um absoluto” (Henri Bergson)
A exposição Moventes, que Bete Esteves apresenta na Galeria de Arte do Instituto Brasil Estados Unidos, Ă© fruto de uma investigação artĂstica dentro da qual vem desenvolvendo trabalhos transdisciplinares em suportes como vĂdeo, fotografia, instalaçÔes e dispositivos eletrĂŽnicos, e que lhe valeu o prĂȘmio do SalĂŁo de Artes Visuais NovĂssimos. Em sua pesquisa, Bete Esteves desenvolve mĂĄquinas que oferecem a possibilidade de situaçÔes lĂșdicas, fantasiosas, no meio fĂsico real, mĂĄquinas que tĂȘm sua função no meio humano deslocada: de produzir serialmente objetos funcionais, para mediar proposiçÔes artĂsticas por intermĂ©dio de procedimentos mecĂąnico-poĂ©ticos. SĂŁo mĂĄquinas artĂsticas que encontram seu territĂłrio de experiĂȘncias e trocas no antagonismo das concepçÔes racionalista e econĂŽmica do sĂ©culo XVII, subvertendo o tempo de produção, sĂŁo mĂĄquinas que trabalham, independentemente de elas funcionarem ou nĂŁo; elas operam, articulam um conjunto de conexĂ”es variĂĄveis, produzem movimentos ou ausĂȘncia de movimentos, sejam eles frutos de destruiçÔes ou de articulaçÔes formais ou estĂ©ticas.
Fumus Boni representa uma espĂ©cie de sĂntese da pesquisa artĂstica de Bete Esteves. A obra Ă© composta por duas mĂĄquinas que produzem e emanam jatos de fumaça, as quais sĂŁo colocadas frente a frente, promovendo uma confluĂȘncia dessas massas de fumaça, em um encontro que propĂ”e como experiĂȘncia estĂ©tica a possibilidade de fruição da efemeridade da matĂ©ria fumaça em um tempo duradouro, o da poĂ©tica – reflete, assim, sobre aproximaçÔes e analogias com as relaçÔes vividas no cotidiano, representadas simbolicamente pelo encontro sutil, pueril, fluido e fugidio das massas de ar. Desta maneira, Moventes Ă© o reflexo de uma produção artĂstica que se vale do movimento contĂnuo, seja ele fĂsico ou fantasioso: no elevador que sobe, no poste que gira, na fumaça que condensa, no gelo que derrete ou na poeira que se adensa. Pode-se dizer que, em sua investigação poĂ©tica, a artista contamina-se com algumas das ideias de Henri Bergson sobre movimento e tempo. Bergson refere-se Ă duração como uma soma de momentos que forma um Ășnico tempo coeso, oposto ao tempo fĂsico, possĂvel de ser mensurado. Assim, o tempo da experimentação, ou tempo vivido, Ă© incompreensĂvel para a inteligĂȘncia lĂłgica, por ser qualitativo, enquanto o tempo fĂsico pode ser analisado e calculado, por ser quantitativo. O tempo, ou melhor a duração, na obra de Bete Esteves, requer um tempo com qualidade, um momento especial de contato com elementos quase imperceptĂveis, com informaçÔes mĂnimas, que convidam Ă imersĂŁo em um universo a meio caminho entre o espaço terrestre e o celeste, que nas palavras da artista Ă© denominado como "canteiro de constelaçÔes".
Ao longo de toda a histĂłria da humanidade, sempre houve mĂĄquinas e elas sempre foram substituĂdas por outras, cada vez mais eficazes. Em Fumus Boni, a fumaça Ă© tĂŁo efĂȘmera quanto a mĂĄquina que a produz; e Ă© a relação de tempo qualitativo criada que torna perpĂ©tuos os elementos em princĂpio considerados efĂȘmeros. A relação das mĂĄquinas coletoras de poeira, que captam as partĂculas do ar e as adensam, para que em seguida elas sejam dispersadas novamente no ar, em Puerile, Ă© tĂŁo cĂclica quanto a da condensação da ĂĄgua e do derretimento do gelo na obra que alude ao cruzeiro do sul, ConstelaçÔes SolĂșveis. A obsolescĂȘncia das mĂĄquinas e tecnologias de mĂdia atuais impĂ”em Ă proposição artĂstica um movimento cĂclico – criar, findar e recriar. O que fica Ă© a potĂȘncia simbĂłlica da poĂ©tica exercida pela mĂĄquina, cujo produto alcança o fruidor por meio do encantamento que exerce sobre ele e da possibilidade de encontros fortuitos que indicia.
Humberto Farias
“Experimento o objeto, faço de seu movimento minha experiĂȘncia dele, nele – assim apreenderei um absoluto” (Henri Bergson)
A exposição Moventes, que Bete Esteves apresenta na Galeria de Arte do Instituto Brasil Estados Unidos, Ă© fruto de uma investigação artĂstica dentro da qual vem desenvolvendo trabalhos transdisciplinares em suportes como vĂdeo, fotografia, instalaçÔes e dispositivos eletrĂŽnicos, e que lhe valeu o prĂȘmio do SalĂŁo de Artes Visuais NovĂssimos. Em sua pesquisa, Bete Esteves desenvolve mĂĄquinas que oferecem a possibilidade de situaçÔes lĂșdicas, fantasiosas, no meio fĂsico real, mĂĄquinas que tĂȘm sua função no meio humano deslocada: de produzir serialmente objetos funcionais, para mediar proposiçÔes artĂsticas por intermĂ©dio de procedimentos mecĂąnico-poĂ©ticos. SĂŁo mĂĄquinas artĂsticas que encontram seu territĂłrio de experiĂȘncias e trocas no antagonismo das concepçÔes racionalista e econĂŽmica do sĂ©culo XVII, subvertendo o tempo de produção, sĂŁo mĂĄquinas que trabalham, independentemente de elas funcionarem ou nĂŁo; elas operam, articulam um conjunto de conexĂ”es variĂĄveis, produzem movimentos ou ausĂȘncia de movimentos, sejam eles frutos de destruiçÔes ou de articulaçÔes formais ou estĂ©ticas.
Fumus Boni representa uma espĂ©cie de sĂntese da pesquisa artĂstica de Bete Esteves. A obra Ă© composta por duas mĂĄquinas que produzem e emanam jatos de fumaça, as quais sĂŁo colocadas frente a frente, promovendo uma confluĂȘncia dessas massas de fumaça, em um encontro que propĂ”e como experiĂȘncia estĂ©tica a possibilidade de fruição da efemeridade da matĂ©ria fumaça em um tempo duradouro, o da poĂ©tica – reflete, assim, sobre aproximaçÔes e analogias com as relaçÔes vividas no cotidiano, representadas simbolicamente pelo encontro sutil, pueril, fluido e fugidio das massas de ar. Desta maneira, Moventes Ă© o reflexo de uma produção artĂstica que se vale do movimento contĂnuo, seja ele fĂsico ou fantasioso: no elevador que sobe, no poste que gira, na fumaça que condensa, no gelo que derrete ou na poeira que se adensa. Pode-se dizer que, em sua investigação poĂ©tica, a artista contamina-se com algumas das ideias de Henri Bergson sobre movimento e tempo. Bergson refere-se Ă duração como uma soma de momentos que forma um Ășnico tempo coeso, oposto ao tempo fĂsico, possĂvel de ser mensurado. Assim, o tempo da experimentação, ou tempo vivido, Ă© incompreensĂvel para a inteligĂȘncia lĂłgica, por ser qualitativo, enquanto o tempo fĂsico pode ser analisado e calculado, por ser quantitativo. O tempo, ou melhor a duração, na obra de Bete Esteves, requer um tempo com qualidade, um momento especial de contato com elementos quase imperceptĂveis, com informaçÔes mĂnimas, que convidam Ă imersĂŁo em um universo a meio caminho entre o espaço terrestre e o celeste, que nas palavras da artista Ă© denominado como "canteiro de constelaçÔes".
Ao longo de toda a histĂłria da humanidade, sempre houve mĂĄquinas e elas sempre foram substituĂdas por outras, cada vez mais eficazes. Em Fumus Boni, a fumaça Ă© tĂŁo efĂȘmera quanto a mĂĄquina que a produz; e Ă© a relação de tempo qualitativo criada que torna perpĂ©tuos os elementos em princĂpio considerados efĂȘmeros. A relação das mĂĄquinas coletoras de poeira, que captam as partĂculas do ar e as adensam, para que em seguida elas sejam dispersadas novamente no ar, em Puerile, Ă© tĂŁo cĂclica quanto a da condensação da ĂĄgua e do derretimento do gelo na obra que alude ao cruzeiro do sul, ConstelaçÔes SolĂșveis. A obsolescĂȘncia das mĂĄquinas e tecnologias de mĂdia atuais impĂ”em Ă proposição artĂstica um movimento cĂclico – criar, findar e recriar. O que fica Ă© a potĂȘncia simbĂłlica da poĂ©tica exercida pela mĂĄquina, cujo produto alcança o fruidor por meio do encantamento que exerce sobre ele e da possibilidade de encontros fortuitos que indicia.
Humberto Farias