Top Social

Texto de Fernanda Lopes para Frederico Filippi


Nada disso é verdade




Se queres transformar-te num homem de letras, e, quem sabe um dia escrever Histórias,
 deves também mentir, e inventar histórias, pois senão a tua História ficaria monótona.
(Umberto Eco)



“Estar de acordo com os fatos ou a realidade”, "ser fiel às origens ou a um padrão", ou ainda "aquilo que é real ou possivelmente real dentro de um sistema de valores. Outras leituras possíveis trazem também o sentido de fidelidade, constância, sinceridade e boa fé em atos, palavras e caráter, além de uma relação com a ideia de “cópia ou imitação fiel”. Essas definições da palavra “Verdade” remetem ao mesmo tempo à questões centrais e opostas, como certeza, crença, realidade, imaginário e ficção.
A produção de Frederico Filippi passa por essas questões. Não pela verdade em si, como algo absoluto. Ao contrário, ele está mais interessado em nos colocar em dúvida diante daquilo que para o senso comum parece ser fonte de certeza. O mundo como o conhecemos é para ele uma invenção, estabelecida e compartilhada, e como tudo o que é inventado, é inventado por alguém, por algum motivo, e por isso poderia ser desfeito e reinventado a todo e qualquer momento.

Deuses Impostores parte desse princípio. Nessa exposição, o artista apresenta um conjunto inédito de trabalhos, feitos especialmente para Galeria IBEU. Pinturas, desenhos e vídeo estabelecem diálogos com estudos de etnólogos como Claude Lévi-Strauss e Eduardo Viveiros de Castro, sobre o Centro Oeste e a Amazônia brasileira. Essas obras nos dão pistas de uma mitologia improvisada, que alça a ciência ao patamar de divindade, tornando possível a transformação de aeronaves e objetos voadores em seres excepcionais, que descenderiam dos céus para salvar a vida humana, ou para perturbá-la. 

No meio do caminho entre abstração e figuração, as imagens reunidas em Deuses Impostores reforçam a indefinição sobre aquilo que estaríamos vendo. Ou melhor, sobre aquilo que acreditamos ver ou que nos é dado a ver. Elas estabelecem uma relação pendular entre ordem e desordem, entre real e possivelmente real, entre fidelidade e boa fé, entre certeza e crença. Nada disso é verdade. A dúvida é o motor da obra.


Fernanda Lopes